Dário Cannatà, Vítor Israel

23 de Setembro a 13 de Outubro de 2011






















































Textos :

Dário Cannatà

A primeira vez que vi os Terrils, não consegui compreender a sua natureza, a sua origem. 
A sua cor escura e tamanho sugerem algo bastante 
difícil de ser criado pelo homem, ao mesmo tempo, algo único de mais 
para não o ser. A imagem das pirâmides do Egipto piscavam-me na 
memória, sugerindo uma clara intervenção humana, em conjunto com 
uma visão pitoresca e naif de uma montanha, o que contradizia a noção 
anterior, sugerindo uma criação sublime da Natureza. 
Ninguém me tinha dito do que se tratava e concluí então que se tratavam 
de montes naturais muito peculiares e bonitos. Estava então em Vimy 
na região Nord Pas-de-Calais, a região mais a norte da França, a visitar 
um memorial da Iª Guerra Mundial, num ponto alto da geografi a, a cerca 
de 10 quilómetro de distância dos montes. Conseguia ver uns 5 ou 6, 
todos com tamanhos diferentes. Dois lado a lado, e os outros um pouco 
mais dispersos. No entanto percebia-se que era uma coisa local, o que 
justifi cava a ideia que deveria existir uma razão bastante específi ca para 
a sua presença, fosse ela natural ou artifi cial.
Percebi mais tarde, entre conversas com o françês que me acompanhava, 
que se tratava de algo artifi cial, criado pelo homem. E fez todo o sentido. 
Foi como perceber que os buracos no jardim eram afi nal de uma toupeira. 
Os Terrils são montes feitos de restos e rochas residuais de minas que, 
retirados com o carvão, foram amontoados na superfície das minas. O 
carvão era posto de parte e os restos eram reorganizados num monte. 
O maior da Europa tem 180 metros.
O norte da França apresenta uma geografi a ideal para observar este 
fenómeno humano devido à sua topografi a plana e à sua história, que 
permitiu que estes montes permanecessem. Nos EUA por exemplo, as 
empresas estavam proibidas de deixar montes abandonados após a 
exploração mineira. Hoje, as pirâmides negras abandonadas sobre a 
paisagem, lembram-nos que mesmo que elas tenham sido feitas pelo 
homem, portanto artifi ciais, elas são também naturais, fazendo assim 
parte do mundo biológico.
O trabalho apresentado na galeria painel é um refl exo desta realidade.
Apresento uma série de 6 gravuras a linólio e um livro impresso em 
serigrafi a. Todo o texto está em Frances uma vez que não poderia ser 
de outra forma, por respeito aos Terrils e ao meu amigo René Magritte.


Vítor Israel

Vou escrever um texto que toda a gente entenda:

O Chico e o Zé convidaram-me para fazer esta exposição e eu aceitei. Eles são gajos fixes. Disseram-me que na Galeria Painel era chato furar as paredes e que por isso seria conveniente mostrar trabalhos que não fossem pinturas sobre tela, porque como toda a gente sabe, as pinturas sobre tela costumam colocar-se penduradas numa parede. Depois de muito pensar decidi apresentar 3 trabalhos:

“Bandeira”:

Quando estou a pintar tenho um pano ao lado que serve para limpar os excessos da tinta que ficam nos pincéis, ou para limpar um qualquer acidente com tinta que possa surgir. Com o passar do tempo esse pano fica todo manchado de cores. Decidi agrafá-lo a uma tábua que usava como régua. Parece uma bandeira.

- “Taça Tesa”:

Uso bastante fita-cola da marca Tesa para me auxiliar nas pinturas, e com isto comecei a achar que as fitas usadas em vez de irem para o lixo deviam servir para alguma coisa. Comecei por fazer uma barba, que era uma construção agradável à vista mas de difícil manutenção. A solução óbvia foi transformar a barba numa bola, e desde então, todas as fitas usadas nas pinturas serviram para alimentá-la e fazê-la crescer. Também guardo os restos de cartão que sobram dos rolos, os quais são empilhados de forma a apoiar a bola no seu topo. Parece um troféu.

“Cordilheira”:
Já fiz uma data de pinturas que não me agradaram. Cortei algumas delas aos triângulos. Um triângulo parece uma montanha. Muitos triângulos parecem uma cordilheira.

                                                                                                                                            Vítor Israel


CV
Vítor Israel – Porto 1983
Licenciado em Artes Plásticas – Pintura pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto - 2009
Estudante Erasmus na Akademia Sztuk Pięknych de Cracóvia, Polónia – 2008/2009
Frequenta o Mestrado de Pintura na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto












De que serve a galeria e de que serve aniquilá-la ?

De que serve a galeria ao artista e de que serve aniquilá-la (se posso convidar
quem eu quiser para ver o meu
trabalho em qualquer outro lugar) ?

1- Serve por razões económicas, ligadas à visibilidade e aos testes (provas de
competência perante os
entendidos) de progressão na carreira artística. Começa a preparar o futuro
do artista libertando-o numa jaula
pública, ou pelo menos acessível à possibilidade de existir um ( vários, julga-se
importante ) espectadores.

2- Serve por razões psicológicas; tem a capacidade de produzir no artista, e
nos seus, orgulho, e no melhor
dos casos, brio.
É um espaço essencial nas estruturas do sistema artístico pois inicia aumentos
de confiança em todos os
envolvidos (menos talvez nos perseguidores do pelotão dos artistas exibidos).
Não deixa nunca de ser uma
oportunidade celebração da feitura de qualquer coisa. Isso é muito
importante, ver o que se fez com o corpo e
a mente.



3- Ajuda na conquista do estatuto reconhecido socialmente. Enquadra o
fazedor, o artista, no agregado de
quem faz na comunidade. Serve por razões sociais. Estabelece contactos entre
a comunidade de artistas
fazendo estilisticamente a triagem dos indíviduos : os interessados no
projecto em particular que a galeria
apresenta, os bons contactos, os companheiros de “profissão”, os investidores e
as novas pessoas
interessantes. Funciona como qualquer espécie de praça, apesar de ser um
espaço que sofre uma mutação de
privado para público e vice versa. É na galeria que o ou os artistas oferecem a
possibilidade de comunicação
com o espectador na forma em que essa comunicação é enquadrada na
sociedade e nas visões que esta
sociedade tem do lugar da obra de arte.


4- Serve por razões educacionais. Existe uma história do galerismo, mais ou
menos controversa, e o diálogo
exigido pela galeria ao artista com essa mesma história não encontra outra
estrutura que não a galeria para
ser apreendido, aprendido e moldado. Por outro lado, a existência de um
público normalmente especializado,
como os compinchas de trabalho, coloca a apresentação de uma obra de X
como um evento; um evento que
possui uma estrutura de proposta e de posterior debate, até dos mais obscuros
pormenores de alguma da


intimidade do artista, que rivaliza em estilo com algumas premissas do ensino
artístico. Se bem que na
prática, os espaços sociais onde essas aprendizagens ou desaprendizagens se
inserem é diferente de uma
instituição de ensino para uma instituição como montra (como um local de
paragem, de chegada, de hiato na
prática).


666- De que serve aniquilá-la ? A multiplicação de formatos expositivos pode
esventrar a noção de galeria
enquanto espaço central da prática artística. No caso de uma cidade de
tamanho médio em comparação com
o resto da Europa, as relações pessoais e a cartilha de actividade cultural da
cidade, onde a existência de
algumas zonas conhecidas como àreas de forte cooperação cultural define as
relações topográficas da relação
dos artistas com o resto da cidade, existem algumas novas frentes de batalha
criadas muito em parte pela
impossibilidade das estruturas mais poderosas englobarem diferentes posturas
geracionais. É natural
existirem franjas em qualquer comunidade. Aquilo que parece ser mais
relevante é aparente incapacidade de
diálogo geracional que não comprometa os artistas com mais do que as suas
convicções.
Francisco Babo